Há quanto tempo! Depois de realizar o primeiro torneio presencial de The King of Fighters XI em um major do Brasil, neste caso o Comitê Arena, venho aqui ressuscitar um fio que fiz no (até então) finado Twitter com os motivos que me fazem amá-lo como meu fighting game favorito da vida. Sem exageros.
Tudo inicia no tempo em que a Internet já chegava em banda larga nos lares brasileiros. Os games de produtoras japonesas naquele tempo eram lançados inicialmente em sua terra natal e depois de meses eram trazido ao Ocidente por publishers européias e norte-americanas. Essa demora padrão meio que acalmava meus ânimos, já me avisando que muitas pessoas jogariam qualquer jogo antes de mim.
A série vinha em decadência depois da falência da SNK original em 2000 e agora a Playmore - que se tornou SNK Playmore - deu continuidade à clássica série de Kyo Kusanagi e Iori Yagami. O último KOF canônico anual a ser lançado foi o KOF 2003, último título da série também para o "cansado" NeoGeo que desde 1990 era o palco dos jogos produzidos pela SNK. E então, nós brasileiros tínhamos o maravilhoso KOF 2002, um absurdo sucesso em tudo quanto é fliperama, sustentando a fama e o interesse dos noventistas pela franquia de três letras em sua sigla.
Eu mal soube que esse tal de The King of Fighters XI tinha sido anunciado em 2005. Estava acompanhando novidades como SVC Chaos (2003 no Arcade e 2004 nos consoles) e o aguardado NeoGeo Battle Coliseum (2004 nos Arcades e 2005 no PS2) via site oficial. O máximo que eu tinha de informações naquele ano sobre o décimo primeiro episódio da minha série favorita era sobre sua formação de times inteiramente inéditos (em notícia pelo site KOF Rivals), além de servir como continuação do "mal-sucedido" KOF 2003. Eis o motivo inicial.
I - O legado da série King of Fighters
Sou um cara que teve a "sorte" de viver na periferia de São Paulo e amar videogames. Embora meu amor por jogos de luta tenha nascido em séries da rival Capcom com os jogos Street Fighter Alpha 2 e X-Men vs. Street Fighter, a insistência de pessoas e das revistas de videogame em me mostrar que um tal de The King of Fighters valia mais a pena cada ficha paga era gritante por causa do seu combate de trios.
Desde (KOF) 1997, eu flertava mas não queria aceitar um romance com aquele jogo que tinha mais cara de suburbano e adulto do que o mencionado SF. Mas a gente cresce: a influência de amigos e o amadurecimento comum bateram na minha porta quando o poderoso KOF '98 foi lançado. Ali, assinei um contrato de amor vitalício com a série. Qualquer coisa que veio depois como o nome da franquia tinha minha total atenção.
Foi assim até a chegada de KOF 2003, game que pude jogar no meu PC com Windows XP de 128 de RAM e um HD de 256 GB de capacidade, mais um processador da época que rodava o emulador WinKawaks (que uso de vez em quando hoje em dia), responsável por me apresentar o novo trio de protagonistas da série: Ash Crimson, Duo Lon e Shen Woo.
Shen Woo, Ash Crimson e Duo Lon em artworks do artista Falcoon no KOF 2003. |
Já deu pra entender o porquê de uma continuação ser tão aguardada por mim, não é?
II - Flerte Inicial: A trilha sonora
Um tempo depois, meu falecido e saudoso amigo Wellington (vulgo Gordinho-Diadema) me mostrou a trilha sonora do game, uns dois meses depois do lançamento oficial dele em 26 de outubro de 2005 nos arcades japoneses. Eram 37 músicas do novo game, incluindo temas dos 11 times, dos chefes, abertura e dos finais de time que compartilhavam alguns temas entre si. Ali, eu despertei minha primeira paixão pelo jogo sem nem ao menos tê-lo tocado.
Como não tinha internet banda larga em casa, sempre ia na casa desse mesmo amigo e voltava de lá com muitas informações e downloads sobre diversos assuntos. Gravei um CD com o formato .mp3 daqueles sons inéditos e passei pro meu PC. Mas a graça era reproduzir tudo num aparelho de som que meu pai tinha e ouvir a nova trilha sonora do KOF toda noite, geralmente acompanhado dos meus amigos Gregory "Sansão" e do Danilo "Alemeras" - sim o mesmo do canal de KOF no YouTube e do semanal de KOF XV, o "Reis da Rua".
De cara, aqueles sons mais psicodélicos, acelerados, agudos e experimentais me faziam sonhar com o game entre jogatinas de card game do Pokémon, durante outras jogatinas no próprio PC via emuladores e nomes como Joker (tema do Hero Team), Queen (tema do Rivals Team), Jack (dos bosses Silber e Jazu) e King (tema de Adelheid) já se tornavam meus novos favoritos. Cada vez mais, se aproximava a hora de conhecer o game, lançado para PS2 no fim de 2006.
III - Meu primeiro contato: A sagrada versão de PS2
Nos fliperamas de minha cidade (Diadema, na época) não havia espaço para máquinas tão caras como KOF XI. Ele era fabricado inicialmente para a inédita Atomiswave, sistema de fliperama que iniciou com o lançamento de The King of Fighters Neo Wave, um remake de KOF 2002 com lutadores diferentes e três novos sistemas de batalha, fora uma leve evolução gráfica em cenários e HUDs.
Cenário exclusivo da versão de PS2, Athena's Concert Stage. |
Em 2006, graças ao programa social-político "Escola da Família", muitos estudantes universitários tinham bolsas integrais ou parciais em faculdades. Um método para "se pagar" por esta bolsa, era desenvolver atividades culturais em escolas nos finais de semana. Por isso, na escola Olga Fonseca em Diadema (SP), conhecemos graças ao Rodrigo "Batman" dois apaixonados por jogos de videogame e por fighting games na época: Johnny e Rafael - este último curiosamente era muito parecido com o Robert no visual de KOF XI e Neo Geo Battle Coliseum.
Robert em sua versão mais latina nos games KOF XI e NGBC. |
Ao longo do tempo, pude pegar emprestado e depois comprar meu próprio PS2 e finalmente aproveitar o game da forma que mais gosto: no single player. Descobrir itens secretos no Gallery Mode acessíveis por finais, desafiar as 40 missões do game, explorar o Color Edit e ter a chance de ouvir a trilha sonora em versão Arranged consolidaram o meu amor absoluto por este jogaço. Mas não fiquei só no console.
IV - Ida aos Arcades: A versão Atomiswave
Diferente do que acontece no geral, tive acesso primeiro à versão de PS2 para então descobrir dois lugares em São Paulo que tinha meu novo jogo favorito. Quando trabalhei no município de Santo André (cerca de uma hora de Diadema), tive a chance de descobrir um fliperama bem isolado numa rua do centro comercial de lá. Eu sequer lembro se havia outras máquinas por lá, só lembro de ter entrado em êxtase ao descobrir que existia uma versão de KOF XI perto da Rua Senador Flaquer. Meus dias se tornaram melhor por um bom tempo.
Meus amigos Alemeras e Sansão, no começo de 2007, começaram a frequentar a famosa lan-house e arcade center chamada Venom Arcades. Era um lugar mágico: no térreo, mais de 30 gabinetes de fliperama com games de tudo quanto era tempo. No subsolo, mais de 50 máquinas muito decentes com internet disponível. Era um sonho para um cara de 20 e poucos anos que mal tinha ambição na vida.
Quem teve a sorte de colar nesse pico? Isso aqui era um sonho - misturado ao cheiro de cigarro e máquinas com som mais alto do que funkeiro no busão sem fone. |
Depois dessa descoberta maluca, encontrar outra máquina desse game criou em mim uma espécie de compromisso religioso aos sábados: jogar KOF XI na escola do bairro em Diadema, trabalhar das 15h às 21h em Santo André, e então, sair correndo de volta pra minha cidade e depois pegar um busão que levava uns 45 minutos para chegar ao centro de São Paulo e passar a noite jogando fighting games e desafiar qualquer um na KOF XI. E depois, nada de dormir: sair dali às 6h da manhã e ir até o bairro da Liberdade me custava apenas uma caminhada de 15 minutos e uma espera de mais três horas para ver o comércio abrir por volta das 9h. Sim, domingo de manhã era o momento de namorar aquelas vitrines cheias de action figures e ver a meninada fantasiada era um playground pros meus olhos de nerd.
O prédio mais requisitado da cidade quando se trata de nerdices. Nostálgico! |
Tudo melhorou quando chegou em Diadema o saudoso Kira Point, mais conhecido como "Batalhão" entre amigos - já que o prédio comercial que abrigava essa loja de games ficava ao lado do Batalhão de Polícia no centro da minha ex-cidade. Despertou aqui um desejo inédito: o de ser o melhor.
V - As chamas verdes da vitória e o Ás na manga: o espírito competitivo
Lembro que entre a ida da versão PS2 aos dois dos três arcades de KOF XI que conheci na vida (mais tarde (acho que 2013) tive a chance de jogar na Lords do Tatuapé em São Paulo) rolou o Anime Friends 2007. E em meio àquela experiência maluca de curtir games e animes, meus amigos e eu encontramos KOF XI rodando em campeonato durante o evento. Não estava preparado para isso e mesmo assim entrei no campeonato. Não lembro de ter ganhado uma partida sequer, mas ver a galera assistir meu game favorito me deu uma sensação calorosa: não era raiva e nem vergonha, era euforia.
Em algum pendrive da vida, devo ter minhas fotos do AF2007. |
Meses se passaram e os mesmos organizadores do torneio abriram a já mencionada loja de games, Kira Point em Diadema. Rodrigo e Fábio fizeram a alegria de muitos de nós colocando mais de cinco PS2 em aluguel por hora e ainda alguns computadores no sistema de Lan House. Nesse local, fizemos grandes amizades, inclusive com os próprios donos e por meio da internet deles, hospedávamos o site criado por mim e pelo Alemeras, chamado de KOF Point. Chegamos até mesmo a criar um campeonato de KOF '98 UM chamado de Ultimate Kira Point.
A coisa mais impressionante do Batalhão: tinha uma mesa em formato de estrutura para jogar sentado, toda feita artesanalmente com os botões de Arcade embutidos em dois controles de PS2, manche cotonete e um espaço largo imenso - cabia dois caras de qualquer tamanho bem afastados um do outro! E aqui, jogamos milhares de partidas de King of Fighters, especialmente a XI. Depois de tanto jogar, eu só queria vencer e continuar jogando e ouvindo minhas músicas favoritas. Sim, esse era o motivo pra vencer.
Essa imagem tá tocando um som na minha cabeça, eu juro! |
O metagame de KOF XI gira em torno da sinergia que seus lutadores possuem em combos e setups que permitam trocas seguras. As trocas são feitas com dois socos ou dois chutes e podem ser feitas durante ataques comuns, golpes de comando e especiais de hit. Com a mudança do pad de PS2 para esse Arcade - que considerava divino - eu finalmente avancei em questão de nível no game. Me sentia capaz de jogar o máximo possível. Aprendi muita coisa no jogo com o Parreirinha e com o Alemão Duck King, jogadores veteranos daqui de Sampa. E comecei a amassar geral que aparecia usando o time principal do game, Ash, Shen e agora o estreante Oswald. Aqui, é um caso de amor a parte (leia AQUI).
Minha primeira publicação sobre KOF XI foi feita aqui no blog em 2017 e mostrou um pouco de como gostávamos de jogar e de alguma forma queríamos vencer na vida... pelo menos jogando KOF. Por fim, lembro de mais um pico no qual jogamos o game: no bairro do Campo Limpo, havia uma loja de games na qual colavam grandes nomes de hoje da cena como Kleber Yagami, Renato KOF - hoje Didimokof, eMiTiVi, German e muitos outros da Zona Sul de SP. Foi aqui que conhecemos o David Fogaça (na época Hyousuke).
E o que manteve a chama do amor acesa em mim foi o glorioso tempo no qual eu jogava de igual pra igual ou melhor do que muita gente em São Paulo - mesmo que apenas umas duas dúzias de pessoas tivessem se interessado pelo game, é claro... e então, um longo hiato de mais de 15 anos até que...
Um novo futuro? COMITÊ ARENA 2024
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O BCT conta com poderosos 9 games principais e terá um XI lá! |
Um texto com cadência e muito gostoso de ler. Uma paixão que fulmina e faz todo sentido depois que lemos o texto completo.
ResponderExcluirDemorei um pouco a ler seu relato, esperando a chegada do fim de semana, mas como tinha certeza, valeu muito a pena, Watcher!
ResponderExcluirGosto muito mas muito mesmo deste formato documental, praticamente um registro histórico pelos seus olhos, tanto da história de KOF XI, que sim, joguei muito também no PS2, quanto da época abordada.
Houve um certo "buraco" na nossa história quanto a isso, pois tínhamos relativo acesso ao que rolava especialmente no PS2, compensando a extinção de muitas publicações físicas e ausência de informações mesmo no digital em grandes sites. Lembro que basicamente quase todas as novidades, eu obtinha por intermédio de fóruns, alguns dos quais infelizmente também extintos hoje.
Meus parabéns por "ressuscitar" esta mídia semimorta que são os blogs, meu querido Vigia. Por coincidência há algumas semanas, ao buscar alguns arquivos, esbarrei em alguns e fiquei maravilhado ao ver que ainda estavam de pé, mesmo que sem publicações recentes.
Vida longa ao Blog do Vigia!